domingo, 18 de julho de 2010

O ESCRAVISMO COLONIAL - Jacob Gorender

GORENDER, Jacob. O Escravismo Colonial. São Paulo: Ática, 1978. (p. 53-87 e 164-171)


CAPÍTULO I – ESCRAVISMO COLONIAL – MODO DE PRODUÇÃO HISTORICAMENTE NOVO:
- “Com o descobrimento no ano de 1500 e a subseqüente colonização, puseram-se, uma diante da outra duas formações sociais heterogêneas: a dos Conquistadores europeus e a das tribos autóctones.” (p. 53)
               O autor cita Marx. E segundo Marx, existem três possibilidades nas conquistas. Porém, para o autor, na América nenhuma das três possibilidades se concretizou (p. 53): 
- “O modo de produção predominante no Portugal da época, não se transferiu ao país conquistado. (...) O modo de produção resultante da conquista – o escravismo colonial – não pode ser considerado uma síntese dos modos de produção preexistentes em Portugal e no Brasil.” (p. 54)
- “O estudo da estrutura e da dinâmica do modo de produção escravista colonial (...) demonstrará o que desde logo vem afirmando, ou seja, que se tratou de um modo de produção historicamente novo (...)” (p. 54, 55)
                   O autor utiliza algumas citações de Marx sobre o emprego do trabalho escravo e sobre o aspecto anômalo que constituiu o escravismo americano para ele (Marx) a princípio. Porém, que em O Capital, já é uma tese totalmente ausente. Para o autor, houve um amadurecimento nas idéias de Marx, a respeito da escravidão. (p. 55 e 56)
                  O autor expõe sua opinião sobre a idéia de capitalismo anômalo (p. 57):
- (...) na questão do escravismo americano, considero inaceitável a tese do caráter capitalista, anômalo ou não. Tanto mais, adiciono a título de reforço, que o próprio Marx se encarregou de demonstrar essa inaceitabilidade com o que sobre o assunto escreveu em sua obra principal.” (p. 57)
                 Sobre a idéia de Modo de produção arcaico (Genovese):
- “Pela sua escala, o escravismo mediterrâneo antigo, sobretudo o romano. Há em ambos, de fato, o traço comum do trabalho escravo como tipo dominante de exploração da mão-de-obra. Mas a estrutura e a dinâmica forma distintas em um e outro, tanto que a sociedade imperial romana se defrontou com o impasse representado pela impossibilidade de evolução do escravismo patriarcal arcaico ao escravismo mercantil moderno.” (p. 58)

CAPÍTULO II- A CATEGORIA ESCRAVIDÃO:
                 O autor usa argumentos de Aristóteles e Montesquieu para caracterizar o escravo:
- “O escravo, instrumento vivo como todo trabalhador, constitui ademais “uma propriedade viva”. A noção de propriedade implica a de sujeição a alguém fora dela: o escravo está sujeito ao senhor a quem pertence.” (p. 60)
- “A escravidão propriamente dita é o estabelecimento de um direito que torna um homem completamente dependente do outro, que é o senhor absoluto de sua vida e seus bens.” (p. 61)
                     O primeiro atributo do ser escravo é ser propriedade e daí, surgem outros dois atributos: perpetuidade (ser escravo por toda a vida) e hereditariedade (transmitir essa condição à seus filhos). Esse tipo de escravidão, “ser propriedade perpétua e hereditária” seria a forma completa de escravidão. A forma incompleta seria quando a escravidão cessasse após um determinado tempo e não fosse transmitida aos filhos.  (p. 61, 62)
                 Gorender cita Charles Parain ao falar de escravidão geral, conceito que não teria sido aprofundado por Marx:
- “Charles Parain, por exemplo, lança mão do conceito, separando a “escravidão geral” da “escravidão propriamente dita”. A primeira se manifestaria no recrutamento forçado de trabalhadores pelo Estado para a execução de obras de interesse público, como é peculiar do modo de produção asiático. Na segunda teríamos o escravo como propriedade privada, comprado, mantido e explorado por um empresário particular.” (p. 62)
                   Idéia de escravo como “coisa” (p. 63):
- “Mas o escravo, sendo uma propriedade, também possui corpo, aptidões intelectuais, subjetividade – é,em suma,um ser humano. Perderá ele o ser humano ao se tornar propriedade, ao se coisificar?” (p. 63)
- “O boi serve de escravo aos pobres.” Aristóteles (p.64)
- “Os negros eram marcados já na África, antes do embarque, e o mesmo se fazia no Brasil, até o final da escravidão.” (p. 64)
- “O primeiro ato humano do escravo é o crime, desde o atentado contra seu senhor à fuga do cativeiro. Em contrapartida, ao reconhecer a responsabilidade penal dos escravos, a sociedade escravista os reconhecia como homens: Além de incluí-los no direito das coisas, submetia-os à legislação penal.” (p. 65)
                   O direito escravista sofre modificações que limitavam o domínio do senhor e reconheciam de certo modo a condição humana do escravo (p. 68):
- “Quanto mais acentuado o caráter mercantil de uma economia escravista, o que se deu sobretudo nas colônias americanas, tanto mais forte a tendência a extremar a coisificação do escravo. As modificações jurídicas limitadoras dessa tendência só podiam ter efetivação concreta muito relativa nos domínios agrícolas isolados, onde a supremacia do senhor sobre o escravo não padecia de restrições práticas.” (p. 68, 69)
                   Duas culturas e uma mesma forma para tratar o escravo: Aristóteles: “Três coisas são a considerar no escravo: o trabalho, o castigo e o alimento.” Eclesiastes: “Ao escravo, pão, correção e trabalho. (p. 69)
                   Para o autor, existe uma associação natural entre trabalho e castigo do ponto de vista do escravocrata, e esse castigo seria necessário e justo:
- “De qualquer maneira, não devemos supor tivessem os senhores, interesse em inutilizar seus escravos que, afinal,como dizia o livro Bíblico,eram seu dinheiro.” (p. 71)
                    A fiscalização do trabalho escravo era realizada pelo Feitor, e este seria um gasto improdutivo, porém necessário. Gorender novamente cita Marx para expor esta idéia (p. 72):
- “...este trabalho de vigilância é necessário em todos os modos de produção que repousam sobre a oposição entre o trabalhador,enquanto produtor direto,e o proprietário dos meios de produção. Tanto maior esta oposição, tanto maior será o papel que desempenha este trabalho de vigilância. Ele atinge, em conseqüência , seu máximo no sistema escravista.” (p. 72)
                    A idéia de que o trabalho dignifica o homem é expressa por Hegel, e citada pelo autor. E o autor destaca a conquista de independência da consciência do escravo através de seu trabalho (p. 73):
- “(...) alcança então a consciência de ser ela própria em si e para si. Enquanto o senhor apenas desfruta do produto do trabalho, consome-o,porém não o cria, o escravo,ao contrário,entretém com a coisa, com o objeto do trabalho, uma relação essencial.” (p. 73)
                    Considerações sobre os tipos de trabalhadores escravos (p. 74, 75, 76, 77):
- “Considerando em sua massa, sobretudo nos domínios agrícolas, o escravo era um mau trabalhador, apto apenas a tarefas simples, de esforço braçal sem qualificação. (...) ao contrário da classe dos operários livres, os escravos como classe eram incapazes de ascensão técnica em massa. Em contrapartida, o escravo vivia como consumidor irresponsável.” (p. 74, 75)
- “A escravidão desenvolveu-se em sociedades de forte predominância agrária. A grande maioria dos escravos destinava-se, portanto, ao trabalho nos estabelecimentos agrícolas e neles residia (...)” (p. 75)
- “Nas cidades, a sorte era menos dura para o escravo e seu emprego se diversificava. (...) No Brasil, os mestres artesãos habitualmente se serviam de escravos treinados e, por isso, mais caros.” (p. 75)
- “Encontramos, por isso, escravos trabalhando em oficina própria ou montada pelo senhor, realizando pequenos negócios nas ruas, prestando serviços manuais contratados por terceiros. (...) Numerosos escravos urbanos desfrutavam de liberdade de locomoção de certa latitude, negada aos escravos rurais.” (p. 76)
- “Por fim, uma categoria especial foi sempre a dos escravos domésticos, a serviço pessoal da família do senhor nas residências rurais ou urbanas, fosse no Oriente, na Antiguidade Greco-Romana ou nas colônias do continente americano. (...) enquanto no Brasil os escravos executavam quase apenas as funções do trabalho manual,ascendendo quando muito a tarefas de capatazia, excepcionalmente de administração de um estabelecimento agrícola,os escravos, na casa romana,supriram, de modo regular,as funções de mordomos, professores, médicos, artistas,literatos, secretários,copistas,etc.” (p. 77)
                   O escravo como propriedade:
- “O escravismo implica um mecanismo de comercialização que inclui o tráfico de importação, os mercados públicos e as vendas privadas de escravos. (...)m a família escrava não recebia reconhecimento civil.” (p. 78)
- “Assim,pelo direito de propriedade que neles tem, escreveu Perdigão Malheiro, pode o senhor alugar os escravos, emprestá-los, vendê-los, doá-los, transmiti-los por herança ou legado constituí-los em penhor ou hipoteca, desmembrar da sua propriedade o usufruto, exercer, enfim, todos os direitos legítimos de verdadeiro dono ou proprietário.” (p. 78)
- “(...) em todos os países escravistas, antigos e modernos, cresceu o número dos libertos, subordinados também eles a uma condição especial, que os inferiorizava com relação aos homens nascidos livres.” (p. 79)
- “Os filhos de escravas deviam constituir frutos da propriedade, à maneira das crias dos animais irracionais.” (p. 80)
                 Escravidão, servidão da gleba e trabalho assalariado:
- “O que designamos por escravidão e escravo tinha, entre os romanos, as designações de servitus e servus.” (p.80)
- “De acordo com Charles Verlinden, o termo sclavus surgiu entre os germanos, num limitado período dos séculos X e XI, aplicado aos cativos de origem eslava, trazidos do Oriente europeu. Sclavus (em alemão, Sklave) indicava,portanto, o cativo estrangeiro, procedente de país eslavo, e o distinguia do servus, da própria nacionalidade germânica. (...) no século XIII, os venezianos e genoveses passaram a carrear à Bacia do Mediterrâneo um fluxo constante de cativos do Mar Negro,o termo sclavus lhes foi aplicado de novo e se tornou de uso corrente na Itália, Daí se estendeu a outros países do Ocidente,sendo adotado nos textos franceses e ingleses a fim de distinguir os servos nativos dos cativos estrangeiros.” (p. 81)
- “O que a escravidão e servidão possuem em comum é a coação extra-econômica do produtor direto, embora suas modalidades concretas sejam diferentes para o escravo e para o servo.” (p. 83)
- “O trabalhador assalariado, consubstancial ao capitalismo, representa o primeiro tipo de trabalhador explorado do qual desaparecem os últimos resíduos de apropriação pessoal por parte do explorador e que, por isso, integra o processo da produção como força puramente subjetiva.” (p. 85)
- “Entretanto, para que a força de trabalho seja mercadoria e não o seja o próprio operário, é imprescindível que este último não venda sua força de trabalho senão por um curto prazo de cada vez, voltando a dispor dela após o término de cada transação contratual com este ou aquele capitalista.” (p.85)
                Segundo o autor, tanto Marx como Max Weber reconhecem no operário assalariado livre uma aparente ”liberdade”, mas que na verdade continua se sujeitando, de certa forma, a um trabalho forçado:
- “... o trabalhador pode ser abandonado às ‘leis naturais da produção’, isto é, à dependência do capital, engendrada, garantida e perpetuada pelas próprias condições da produção.” (p. 87)

CAPÍTULO VIII – LEI DA RENDA MONETÁRIA
               Forma predominante do excedente no escravismo colonial:
- “No escravismo colonial, a lei de apropriação do sobretrabalho formula-se da seguinte maneira: a exploração produtiva do escravo resulta no trabalho excedente convertido em renda monetária. Denomino de renda monetária aparte do excedente comercializado e transformada em certa quantidade de dinheiro.” (p.164)
- “(...) também produzia outra parte do excedente que conservava em sua forma natural, de bens que o senhor não destinava à comercialização, mas ao consumo direto de sua família e dependentes pessoais, esta parte do excedente recebe o nome de renda natural.” (p. 164)
-“As categorias de renda natural e renda monetária permitem estabelecer a diferença essencial entre dois tipos históricos de escravismo: o escravismo patriarcal e o escravismo mercantil ou colonial. Ambos basearam-se na forma completa de escravidão, mas constituíram modos de produção diferentes, com linhas de desenvolvimento peculiares.” (p.165)
                  O escravismo patriarcal:
- “(...) tem o conteúdo de escravidão produtiva, ainda que sua produção assuma a forma de bens de uso consumidos na própria unidade econômica.” (p. 166)
- “Em conseqüência, as necessidades concretas traçam um limite à produção e esta se resume em bens de uso, que satisfazem o consumo individual e asseguram a reprodução no próprio âmbito da unidade econômica.” (p. 167)
                   O escravismo colonial (um modo de produção dependente do mercado metropolitano):
- “O escravismo colonial só possibilita um mercado interno estreito,quase inelástico,inadequado aos fins da produção mercantil, que tende à especialização (...) sua solução constituía uma das premissas da plantagem colonial. A produção desta última se escoaria no mercado externo já existente e em ampliação,com uma demanda crescente de gêneros tropicais – o mercado da Europa.” (p. 169)
-“O escravismo colonial não comportava a mercantilização total, pois subsiste nele um setor de economia natural, porém o comércio intensificado não exerce efeito desagregador na sua estrutura. O escravismo colonial nasce e se desenvolve com o mercado como sua atmosfera vital” (p. 170, 171)

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

GORENDER, Jacob. O Escravismo Colonial. São Paulo: Ática, 1978. (p. 53-87 e 164-171)



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