quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

A Ação de Classe da Elite Orgânica: A Campanha Ideológica da Burguesia – Questões Sobre o Texto

1. Formas que assumiu a campanha ideológica:

Em seu texto “A Ação de Classe da Elite Orgânica: A Campanha Ideológica da Burguesia”, René Dreifuss nos mostra que havia duas formas de ação utilizadas como tática da chamada “elite orgânica”, e que “compreendiam desde atividades que objetivavam efeitos a longo prazo na orientação global das perspectivas sociais, econômicas e político militares, até táticas defensivas planejadas objetivando ganhar tempo suficiente para a ação estratégica política e militar lograr efeito”. (p. 231) Antes de expor as táticas, torna-se necessário analisar a conjuntura onde essas ações foram desenvolvidas, o alvo dessas ações e os órgãos que se responsabilizaram por elas, bem como entender os objetivos da elite orgânica.
A chamada “elite orgânica” era uma espécie de porta-voz e defensora das idéias do centro ao mesmo tempo em que ampliava as perspectivas elitistas e consumistas das classes médias e alimentava o temor às massas. Também influenciava a classe média contra o Populismo. Competia com a esquerda e o trabalhismo pelo controle do Estado e para isso, utilizava tanto de recursos legais quanto ilegais. “Os principais “alvos” para a doutrinação específica e pressão política- direta eram os sindicatos, o movimento estudantil e a classe camponesa mobilizada, as camadas sociais intermediárias e a hierarquia da Igreja, o Legislativo e as Forças Armadas.” (p. 230)
ADEP, IBAD, ADP, Promotion S.A, SEI e ADCE eram os órgãos que seriam responsáveis pelo desenvolvimento da campanha da elite orgânica, já o IPES preferia manter-se “aparentemente” independente dessas organizações, preferindo agir “por trás dos bastidores”.
Em relação às duas modalidades de ação a primeira era a chamada “Ação ideológica e social” e a segunda era a “Ação político-militar”, vejamos a seguir no que elas consistiam:

Ação ideológica e social: As ações ideológica e social eram combinadas e resultavam em dois tipos de doutrinação:
• Doutrinação geral: Apresentava os questionamentos da elite orgânica aos responsáveis políticos e ao público geral e causava impacto ideológico em públicos específicos e no Estado. Era realizada de forma neutralizadora através da mídia e tinha como objetivo fortalecer as idéias da direita e atacar o bloco nacional-reformista. Eram contra o comunismo, o socialismo, a oligarquia rural e a corrupção do populismo e defendiam a prosperidade do país e melhoria dos padrões de vida da população como fruto da iniciativa privada e não do socialismo ou da intervenção do estado na economia. Empresas e industriais ligados ao IPES/IBAD financiavam indiretamente a elite orgânica, assim como o IPES/IBAD também obtinha apoio de companhias internacionais de propaganda. Usavam a propaganda através de todos os tipos de veículos de comunicação (rádio, televisão, jornais, livros, panfletos, revistas, etc.) para um bombardeio ideológico e político, e promoviam conferências, palestras e simpósios para a divulgação de sua ideologia. Contavam com escritores profissionais, jornalistas e artistas. Conseguiam desta forma, organizar uma grande equipe que trabalhava com a manipulação da opinião pública. Ainda sobre a doutrinação geral, é relevante mencionar que o autor cita a Guerra psicológica através do rádio e televisão e a Guerra psicológica através de cartuns e filmes, ambas promovidas pelo IPES/IBAD para atingir um público grande e de forma eficaz.
• Doutrinação específica: Pode ser notada através da tentativa de moldar a consciência e organização dos setores dominantes para união em torno de um programa de modernização econômica e conservadorismo sócio-político. O objetivo geral era atacar e destituir o presidente João Goulart e conter a mobilização popular, com o apoio de grupos sociais da classe média e das classes dominantes. Um exemplo de ação da doutrinação específica foi o Congresso pelas Reformas de Base, e a campanha da mídia para desarticular o bloco oligárquico-industrial. As propostas de diretrizes políticas do Congresso pelas Reformas de Base cobriam três áreas de interesse: “A ordem política, que compreendia as Reformas Eleitoral, Legislativa, Administrativa, da Estrutura Política, do Judiciário e da Política Exterior; a ordem social, compreendendo a Reforma Agrária, a da Legislação Trabalhista, da participação dos Lucros das Empresas, da Distribuição de renda, da política do Bem-Estar e Previdência Social, da Educação, a Habitacional, a Sanitária e de Saúde Pública; ordem econômica, que incluía as Reformas Monetária e Bancária,Tributária, Orçamentária, da Legislação Anti-Trust, da Política de Comércio Exterior, de Serviços de Utilidade Pública, da política do Uso de Recursos Naturais, como também a Reforma da empresa Privada.” (p. 243-244) Podemos citar ainda,c omo forma de doutrinação específica, a pressão sobre a Igreja que foi exercida por associados do IPES ligados às estruturas eclesiásticas e leiga, e através da Opus Dei, na América Latina. É imprescindível mencionar que imprensa e os intelectuais também exerciam papéis importantes na doutrinação específica.

Ação político-militar: A ação político-militar podia ser percebida na forma com que a elite orgânica procurava “mostrar aos empresários, profissionais e membros das Forças Armadas a imediata ameaça a que estavam sujeitos” (p. 234) com as denúncias de “infiltração comunista”. Um exemplo de ação político militar foi quando, em 1962, a equipe do General Golbery destacou 200 militares das três Forças, enquanto Glycon de Paiva ofereceu uma lista de 200 políticos, além de estudantes, profissionais, jornalistas, empresários, professores universitários e associados do IPES, todos formuladores de opinião para participar da disseminação de material ideológico fornecido pela elite orgânica. Outra forma de ação político-militar eram os Manifestos, sendo importante mencionar o “Manifesto das Enfermeiras às Forças Armadas”, em 1963, onde elas pediam aos militares que interviessem diretamente no processo político contra o governo de João Goulart. Ainda conforme o autor, “um modo mais vil de guerra psicológica era a publicação regular de O Gorila, distribuído dentro das Forças Armadas.” (p. 236)

2. Principais Órgãos de Comunicação Envolvidos:


O texto de René Dreifuss trata a respeito do complexo IPES/IBAD, discutindo as suas formas de atuação e seus principais objetivos.
A elite orgânica buscou promover uma campanha político-ideológica que mobilizasse os mais diferentes setores da sociedade brasileira, principalmente: os sindicatos, o movimento estudantil, a classe camponesa, os setores intermediários, a hierarquia da Igreja, o Legislativo e as Forças Armadas. Ela procurou incitar tanto algumas frações das classes dominantes como grupos de classes médias para enfraquecer o poder executivo, a fim de destituir o presidente João Goulart.
Essa elite apostava em um programa de modernização da economia, que tinha como base a propriedade privada e no âmbito político ressaltava seu conservadorismo, porque somente, dessa forma, poderiam dar fim ao nacionalismo reformista, ao trabalhismo e aos tão temidos ideais comunistas.
O IPES/IBAD precisava incutir as idéias anticomunistas por meio de instrumentos que comunicassem e disseminassem essas informações. “Os canais de persuasão e as técnicas mais comumente empregadas compreendiam a divulgação de publicações, palestras, simpósios, conferências de personalidades famosas por meio da imprensa, debates públicos, filmes, peças teatrais, desenhos animados, entrevistas e propaganda no rádio e na televisão. A elite orgânica do complexo IPES/IBAD também publicava, diretamente ou através de acordo com várias editoras, uma série extensa de trabalhos, incluindo livros, panfletos, periódicos, jornais, revistas e folhetos. Saturava o rádio e a televisão com suas mensagens políticas e ideológicas. (...). O complexo IPES/IBAD também era capaz de articular e canalizar o apoio de algumas das maiores companhias internacionais de publicidade e propaganda, criando assim uma extraordinária equipe para a manipulação da opinião pública. (...) Certas empresas financeiras e industriais ligadas ao complexo IPES/IBAD se incumbiam dos arranjos financeiros, incluindo-os em suas folhas de pagamento, propiciando, assim, outra forma de financiamento indireto da ação da elite orgânica. Escritores, ensaístas, personalidades literárias e outros intelectuais emprestavam o seu prestígio, escrevendo e assinando, eles próprios, artigos produzidos nas estufas políticas e ideológicas do complexo IPES/IBAD”. (p. 232-233)
Sabe-se que o IPES possuía uma ótima relação com jornais e rádios de prestígio. Sem deixar de falar que as televisões nacionais também serviam como eficaz veículo de comunicação. É válido citar alguns jornais importantes que deram respaldo ao IPES, sendo que a maioria destes jornais apresentava algum representante ligado ou associado ao IPES: os Diários Associados, a Folha de São Paulo, o Estado de São Paulo e o Jornal da Tarde, Diário de Notícias, o Correio do Povo e o Globo, entre outros.
Uma infinidade de jornais se colocou à disposição do IPES, dente eles: a Tribuna da Imprensa (que atuava no Rio de Janeiro e era anti- Jango e antipopulista) e as Notícias Populares ( que era destinado a atingir as classes trabalhadoras de São Paulo).
“O complexo IPES/IBAD também mantinha o controle de alguns jornais de menor importância em todo o país. (...)Trabalhos produzidos para consumo empresarial e político eram reescritos em” linguagem de dona-de-casa” por pessoas tão variadas, como Wilson Figueiredo, editor do jornal do Brasil e a romancista Raquel de Queiroz. A escritora Nélida Pinõn, que se prestava como secretária do IPES do Rio, ajudava também nos esforços da propaganda” (p. 233-234).
“Todos esses jornais também mantinham sua própria e acirrada campanha eleitoral, que beneficiava a elite orgânica. Tudo isso era ajudado pelo controle que o complexo IPES/IBAD tinha sobre as agências de notícia e canais de informações em todo o país e o seu relacionamento especial com companhias de publicidade e anunciantes (...)”. (p. 234).
Outra colaboração significativa para o IPES/IBAD foi o patrocínio de manifestos feitos por associações, categorias funcionais e profissionais, entre os que mais obtiveram destaque, encontravam-se: o “Manifesto das Classes Produtoras”, o “Manifesto à Nação”, o “Manifesto das Enfermeiras às Forças Armadas”, o” Manifesto e Carta de Princípios Democráticos do Paraná”, o “Manifesto dos Estudantes de Direito da Universidade Mackenzie” e o manifesto” Para o Brasil, para o seu Progresso e para a Felicidade de seu Povo”.
“A face política e ideológica encoberta do IPES inundava o país com a propaganda anticomunista da elite orgânica, em forma de livros, folhetos ou panfletos. Como já foi observado anteriormente, em termos de doutrina, ele se viu expressando objetivos e ideais da Aliança para o Progresso (...). As publicações que promoviam a Aliança para o Progresso e a Mater el Magistra( profundamente apoiadas na imagem projetada por J. f. Kennedy e o Papa João XXIII) serviam a dois objetivos: proporcionar à opinião pública uma mensagem suficientemente ampla para favorecer a “modernização” do regime e restrita o bastante para indispor o público contra o socialismo, o comunismo e o nacional-reformismo(...).” (p. 235-236)
Segundo Dreifuss, o rádio e a televisão são responsáveis por uma espécie de “bombardeio político e ideológico” contra o Executivo.
“A elite orgânica montou, de fato, uma eficiente e poderosa rede de relações públicas e perícia profissional nos campos de comunicação e propaganda. O IPES fez amplo uso da televisão em sua campanha contra o governo, a esquerda e o trabalhismo, apresentando programas semanais na maioria dos canais a nível regional e nacional.” (p. 245)
“O rádio era um poderoso meio de doutrinação geral e um valioso foco para se montar ações ofensivas contra o Executivo, principalmente em um país com massas pobres, sem condições de terem televisões. Além disso, sendo analfabeta uma grande proporção da população e, conseqüentemente, não atingida pelas atividades doutrinantes da imprensa escrita, o rádio transístor, relativamente barato e acessível nos mais recônditos cantos do país, representava uma ajuda considerável para a elite orgânica (...).” (p. 249)
Filmes, cartuns e charges eram outros recursos utilizados pelo IPES de forma inteligente para alcançar o público que tinha acesso à leitura e ao cinema.
“Para atingir um público grande, o IPES dependia de uma série de filmes extremamente eficazes, produzidos por ele próprio e de outras fitas às quais obteve acesso (...).” (p. 250)
Pode-se concluir que o IPES/IBAD utilizou todos os recursos que pôde para “apagar” o bloco populista da política brasileira e mesmo sem ter tido a capacidade de convencer a todos, ele obteve êxito em um aspecto relevante: conseguiu reunir as classes médias contra o governo.











Referências Bibliográficas:

DREIFUSS, René. A ação de classe da elite orgânica: a campanha ideológica da burguesia – cap. VI (p. 229-279) – In: 1964: A Conquista do Estado. Petrópolis: Vozes, 1981.

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